O ano de 2002 poderia ser o pior da carreira de Michel dos Reis Santana. Logo depois de brilhar na vitória santista por 3 a 2 sobre o São Paulo, pelo Torneio Rio-São Paulo (relembre o jogo no vídeo ao lado), o lateral-direito foi submetido ao exame antidoping que apontou a substância canabinóide, da maconha - o que levou o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) a suspendê-lo por 120 dias. Logo depois, para complicar, a pena acabou aumentada para 160 dias em junho, também por decisão do STJD.
Apesar disso, já naquele mesmo ano, Michel pôde dar a volta por cima. Mesmo punido, o lateral recebeu apoio do elenco do Santos - clube que o revelou, em 1995 - e do técnico Emerson Leão, que o manteve no grupo e lhe deu a chance de fazer parte da equipe que tiraria o Peixe de uma fila de 18 anos sem grandes conquistas. Até por isso, o jogador, hoje sem clube, não tem dúvidas em afirmar que o Brasileirão de 2002 é o título mais importante e marcante da carreira.
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- Foi minha grande conquista. Acho que até pelo lado pessoal, por tudo que passei naquele ano, encerrei 2002 sendo campeão. Agradeci a Deus por voltar a jogar bola e vestir a camisa do Santos. Saí de dentro de um furacão e percebi que estava vivo. O Santos deu essa oportunidade. Além do título em si, aquela foi uma conquista minha, particular - vibra Michel, hoje aos 35 anos.
Michel jogou a primeira partida da final do Brasileiro de 2002, contra o Corinthians (Foto: Agência Estado)
Michel é um dos santistas da geração campeã em 2002 que soube o que foi defender o Santos antes do título da redenção. O curioso é que pesava contra ele justamente o fato de ser formado nas categorias de base - até o surgimento de Diego e Robinho, a torcida santista não demonstrava paciência e nem depositava esperança nos garotos revelados pelo clube.
Eu estava pagando por um erro, por algo que não combinava com o esporte. Mas sempre me doei ao máximo nos treinamentos, na expectativa de reiniciar minha carreira"
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- Quando subi da base, a Vila Belmiro ainda tinha aquele formato antigo, com o gramado ainda mais próximo da torcida do que agora. Acho que a falta de títulos fazia com que o torcedor esperasse que nós resolvêssemos. A pressão era grande, então acredito que, por isso, muita gente que vinha da base acabava não se firmando - diz o lateral.
Devido à suspensão, Michel não participou da formação do time que surpreendeu o Brasil em 2002. Para a posição, o Santos contratou Maurinho, que se firmou como titular da lateral direita até o fim do Brasileiro. A expectativa de Michel era, ao menos, participar ativamente dos treinos da equipe.
- Eu estava pagando por um erro, por algo que não combinava com o esporte. Mas sempre me doei ao máximo nos treinamentos, na expectativa de que a suspensão acabasse e pudesse reiniciar minha carreira - diz Michel.
- Com certeza, acho que aquilo também era um incentivo para eles, pois viam o esforço de um cara mais experiente, que era amigo deles e não estava podendo jogar - emenda.
Enfim, o retorno
Michel se viu livre da punição que o afastou dos gramados no final de setembro. O retorno ocorreu em 9 de outubro, quando foi titular na vitória por 3 a 2 sobre o Atlético-MG, na Vila Belmiro (Maurinho estava suspenso), ainda na primeira fase do Brasileirão (relembre no vídeo ao lado). O lateral ganhou nova chance no jogo de ida das semifinais, contra o Grêmio, outra vez na Vila - dessa vez atuando pela esquerda, na vaga de Léo. “Pé-quente”, o defensor ajudou o Alvinegro a bater o Tricolor gaúcho por 3 a 0 (recorde no vídeo abaixo).
- Treinamos forte durante toda a semana. O Leão acabou me chamando e perguntou se teria problema de eu atuar na esquerda. Eu falei que não, que já tinha sido usado naquele setor. Lembro que (contra o Grêmio) a torcida lotou a Vila e fez uma festa grande para todos, mas para mim, foi uma emoção especial. Depois do que passei, ter a torcida gritando seu nome... - recorda, emocionado.
Uma nova suspensão de Maurinho pelo terceiro cartão amarelo - desta vez na derrota por 1 a 0 para o Grêmio, que assegurou o Santos na final do Brasileirão - deu a Michel a oportunidade de disputar o primeiro jogo da final diante do Corinthians. Partida essa que, na visão do lateral, foi decisiva para que o título nacional de 2002 ficasse com o Alvinegro das Praias.
- Quando o árbitro apitou (o início do jogo), um olhou para a cara do outro e sabia o que fazer. Ninguém se intimidou pelo adversário ser o Corinthians, ou pelo Santos estar tanto tempo sem conquistas. Estávamos todos bem confiantes. E fomos muito superiores. O time foi bem nas duas partidas, mas todos falam, e eu tenho certeza disso, que aquele primeiro jogo (vitória santista por 2 a 0) encaminhou o título - destaca.
De lá para cá, Michel ainda mantém contato com alguns dos campeões brasileiros. Se a proximidade com a dupla Diego e Robinho não é mesma por conta de ambos estarem no futebol europeu, a amizade com alguns dos "veteranos" daquela equipe permanece forte.
- Falo muito com o Preto, André Luiz, Adiel, Paulo Almeida... Com o Robinho, às vezes. Léo e Diego já têm bastante tempo que não falo. Mas vejo as notícias deles, e fico feliz pela história que eles construíram. Há pouco tempo, falei com o Léo Gago (volante do Grêmio) para que ele mandasse um abraço ao Elano. Sempre que possível, a gente tenta manter esse contato - conta.
Rodando o Brasil
Passado o feito histórico de 2002, Michel não teve sequência no Santos. Acabou emprestado a Goiás e Grêmio, até o encerramento de seu contrato com o Peixe em 2005, quando foi para o São Paulo. Pelo Tricolor paulista, fez parte do elenco campeão da Taça Libertadores da América, primeiro título internacional de sua carreira. O lateral, porém, evita comparações entre as conquistas.
- São títulos diferentes, por times diferentes e com torcidas diferentes. Ser campeão pelo São Paulo foi maravilhoso, mesmo sem ter ido para o Mundial (vencido pelo time do Morumbi, no Japão). Já em 2002, por eu me considerar santista e estar com aquele grito entalado na garganta, também foi especial - resume.
Michel ainda passou por Brasiliense, Vila Nova, Fortaleza (onde voltou a ser a suspenso pelo uso de maconha), Avaí, Anapolina, Sertãozinho, CRB, Taboão da Serra, Oriente Petrolero (BOL) e Serrano (BA) - onde ficou por apenas dois dias. Atualmente sem clube, o lateral assegura que ainda está em atividade e corre atrás de um novo desafio.
- Venho me cuidando, treinando a preparação física em uma academia em São Paulo (onde reside) e fazendo bastante corrida. Geralmente, também jogo um futebol com amigos às quartas, sábados e domingos, para não perder a parte técnica. Quero dar sequência à carreira. Sei que tenho condições e futebol para isso - conclui.
Michel (o segundo à esquerda) com Alexandre, Alberto, Julio Sergio, Wellington e Douglas, durante evento em comemoração ao título de 2002 (Foto: Marcelo Hazan / globoesporte.com)
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