quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Achei! Rodrigão mantém faro de gol aos 35 e sonha voltar a um 'grande'


As lágrimas que deixou escapar na derradeira entrevista concedida como jogador da Portuguesa Santista, logo após a eliminação da equipe na quarta e última divisão do Campeonato Paulista, não deixam dúvidas: aos 35 anos, Rodrigão não desistiu do futebol. O choro (veja no vídeo ao lado) mostra que o centroavante, que iniciou a carreira no Santos e passou por clubes como Palmeiras, Internacional, Botafogo e Vitória, ainda se emociona com o esporte que aprendeu a amar. Sim, “aprendeu”, já que o grande prazer, na adolescência, era jogar vôlei de praia.


O ex-marido de Hortência, lendária campeã mundial de basquete pelo Brasil, já soma 15 anos e 20 clubes no futebol, muito por causa do pai. Foi ele que levou Rodrigão para o primeiro teste no Santos e correu atrás de uma nova chance para o filho quando a então promessa do vôlei foi reprovada na peneira – mesmo depois de um gol de bicicleta.


- Eu só queria saber de vôlei de praia (risos). Quando cheguei em casa (após o primeiro teste), sem tanta empolgação, disse ao meu pai que não tinha sido aprovado. Ele perguntou se eu tinha ido mal, e eu falei que não, contei da bicicleta... Então ele foi conversar com o Manoel Maria (ex-jogador do Santos, à época técnico na base do Peixe), e acabei tendo chance em um treino dos juvenis. Marquei três gols, e foi o que precisei para ficar no time. Ou seja: se não fosse a insistência do meu pai, talvez não estivesse aqui hoje.


Rodrigão, atacante da Portuguesa Santista (Foto: Lincoln Chaves)Aos 35 anos, Rodrigão garante: ainda tem muita lenha para queimar na carreira (Foto: Lincoln Chaves)


A carreira, ele admite, já está perto do fim, embora acredite ser capaz de atuar por mais quatro anos. Tanto que Rodrigão já se apronta para o futuro – formou-se em Gestão de Pessoas, estuda Gestão do Esporte e pretende, após pendurar as chuteiras, atuar como gerente de futebol. Embora reconheça não ser fácil, especialmente por desde 2010 não trabalhar com um empresário, o atacante crê ter condições de retornar a um grande clube e aposta na preparação física que faz separadamente dos treinos com bola.


- Já me perguntaram se eu tinha vindo para a Portuguesa encerrar a carreira. Não é isso. É que essa é a minha realidade hoje. E outra: a Portuguesa, como no caso do Jabaquara (time que Rodrigão defendeu em 2012), é um clube de tradição, da minha cidade. É bacana saber que defendi os três clubes de Santos. Poucos tiveram esse prazer. Mas penso, sim, em voltar a uma equipe de maior expressão. Por que não o Santos ou o Internacional? Tudo depende do que eu executar dentro de campo.


Um Menino da Vila atrás de espaço


Do estádio Ulrico Mursa, casa da Portuguesa Santista, onde Rodrigão concedeu a entrevista, é possível ver a Vila Belmiro, palco onde o atacante estreou como profissional. Foi lá também onde marcou o primeiro gol da carreira, na vitória por 3 a 1 sobre o Palmeiras, pelo Torneio Rio-São Paulo de 1999 (veja no vídeo ao lado). O início no Peixe, no entanto, esteve longe de ser fácil para o jogador – e para outros jovens formados na base santista.


- Era uma época diferente das que viveram Robinho e Neymar. Os meninos que subiam já eram muito cobrados, devido à falta de grandes títulos. Talvez muitos jogadores daquela geração tenham sido pouco aproveitados justamente por causa disso. Daria até para montar um grande time só com atletas que subiram naquela época: Baiano, Jean, Gustavo Nery, Marcos Basílio, Fumagalli, Adiel, Ailton, João Fumaça, Eduardo Marques... – citou, lembrando outra característica do Peixe no fim dos anos 90: a aposta em medalhões.


Rodrigão no Santos, em 1999 (Foto: Divulgação / Santos FC)Rodrigão (agachado, primeiro à esquerda), no Santos: 20 gols em 54 jogos (Foto: Divulgação / Santos FC)


Sem espaço no Santos, Rodrigão foi emprestado ao Internacional, em uma negociação que levou o volante Anderson para a Vila Belmiro. A missão do centroavante não era das mais fáceis: substituir Christian, à época ídolo colorado, vendido no ano anterior para o Paris Saint-Germain, da França. Ao lado de Dunga, Elivélton e Lúcio, disputou a Copa João Havelange, caindo nas quartas de final para o Cruzeiro. Mesmo assim, a passagem no Sul é recordada com carinho por "Rodrigol" - como chegou a ser chamado no período em terras gaúchas.


Rodrigão no Inter, em 2000 (Foto: Divulgação / SC Internacional)Rodrigão tem boas recordações de passagem no

Inter, em 2000 (Foto: Divulgação / SC Internacional)


- Graças a Deus, fui muito bem (no Inter). O Zé Mário era o treinador na época. Lembro que, no primeiro jogo, tive uma oportunidade, mas perdi, e o Dunga deu uma prensa, avisando que a cobrança lá era tão grande quanto no Santos. Eu era novo, mas entendi o recado. Pude fazer gols decisivos e acabei me valorizando no fim daquele ano.


Na mesma ocasião, no entanto, Rodrigão se envolveu em um episódio trágico. Em junho de 2000, o atacante bateu o carro contra um poste, que desabou sobre o veículo e acabou matando uma passageira e ferindo outras duas. O jogador, que tinha acabado de comemorar 22 anos, teve uma fratura no braço esquerdo.


- Aquele acidente em 2000 foi um dos momentos mais difíceis da minha vida. Felizmente, tive o apoio de familiares e amigos para superar o que aconteceu. Era muito jovem, e aquilo fez com que eu amadurecesse.


Na Europa, o choque de realidade e a lição


De fato, Rodrigão voltou para Santos. Mais experiente dentro e fora de campo, o jogador ganhou, enfim, status de titular, marcando cinco gols no Paulistão, quatro no Rio-São Paulo e um na Copa do Brasil, mas perdeu espaço na reta final do Estadual, sendo emprestado para o Sport. A experiência em Pernambuco foi curta: apenas três meses, quando, insatisfeito com a situação financeira vivida pelo Rubro-Negro, acabou retornando para o Peixe. Foi quando surgiu a oportunidade de se aventurar na Europa, transferindo-se para o Saint-Etiénne, da França.



Comecei a “pingar” em alguns clubes por não ter esse agente "orientador". Eu via que não tinha oportunidade e queria sair, buscar espaço em outro lugar, ao invés de brigar pela minha chance. Hoje, vejo de outra forma. Se estou numa equipe, brigo pelo meu espaço"


Rodrigão



A experiência no Velho Continente, no entanto, não traz recordações muito boas ao ex-santista. Não só pelo fato de ter atuado pouco, mas porque, segundo ele, conheceu a diferença entre o que chama de agente “orientador” e “negociador” – este último tipo, segundo Rodrigão, é o que o perseguiu em boa parte da carreira.


- Quando fui para a França, tinha recebido a proposta por fax, em inglês. Eu entendia bem o idioma e fiquei de acordo. Quando viajei e vi o contrato lá, os documentos estavam em francês. Eu só entendi os números, e vi que eles batiam com o fax. Meu empresário disse que eu poderia assinar. Mas, conforme fui aprendendo o idioma, descobri que (no contrato) já estavam embutidos 55% em impostos. Não compensava ter deixado o meu país. Eu ainda tinha direito a uma porcentagem da negociação, e, quando conversei com o presidente do clube, ele disse que eu já tinha recebido. Só não sei com quem ficou (o dinheiro). Encerrei a procuração com o empresário e tentei esquecer o que passou para recomeçar.


Mas não foi simples o jogador deixar para trás o que aconteceu.


- Com 21 anos, não tive estrutura emocional ou alguém que me orientasse para dar essa sequência. Tanto que o que eu mais queria era voltar ao meu país. Se eu tivesse um (empresário) orientador, poderia ter ficado na Europa, que estava em alta. Começar do zero por lá. Infelizmente, não tive essa pessoa. Comecei a “pingar” em alguns clubes também pela falta desse orientador. Eu via que não tinha oportunidade e queria sair, procurar espaço em outro lugar, em vez de brigar pela minha chance. Hoje, vejo de outra forma. Se estou numa equipe, brigo pelo meu espaço. Só fui ter esse orientador com 26, 27 anos, que foi o Carlito – lamentou, em referência ao agente com quem trabalhou até 2010.


Goleador no Verdão, campeão no Vitória


A partir daí, Rodrigão começou a rodar. No Botafogo, ficou por seis meses, também sem boas lembranças, já que, além do rebaixamento da equipe à Série B, em 2002, o atacante afirma ter ficado seis meses sem receber salários. Em seguida, passou por Guarani (2003), Marítimo, de Portugal (2004), Santo André (2005), Atlético-PR (2006 a 2007) e Al Hilal, da Arábia Saudita (2007), até chegar ao Palmeiras, emprestado pelo Furacão, aos 29 anos.


- Eu estava bem no futebol árabe. Tinha sido vice-artilheiro da Liga dos Campeões da Ásia, e o clube (Al Hilal) queria minha permanência. Jogava de segundo atacante e fiz 10 gols em 15 jogos. Mas a possibilidade de voltar para um grande no Brasil pesou. Eu tive um mês e meio de adaptação, um pouco de dificuldade, mas encontrei uma pessoa sensacional, que foi o Caio Júnior (técnico). Ele viu que eu necessitava de tempo. O elenco do Palmeiras tinha três centroavantes, ele deu oportunidades para os três, e no fim optou por mim. Tive sequência e fiz gols.


Rodrigão, Palmeiras x Vasco (Foto: Divulgação / Palmeiras)Rodrigão marcou gols decisivos pelo Palmeiras no Brasileiro de 2007 (Foto: Divulgação / Palmeiras)


No Verdão, Rodrigão demorou a engrenar, mas virou titular na reta final de 2007, marcando seis gols nos últimos seis jogos que disputou. A última impressão, porém, não foi suficiente para convencer o técnico Vanderlei Luxemburgo, que assumiu o Palmeiras no fim do ano e, apesar do interesse da diretoria na renovação do empréstimo – o Atlético-PR só aceitava vender o jogador, no que travou as negociações -, liberou o atacante.


Mas foi no Vitória, em 2008, que Rodrigão viveu o momento mais emocionante da carreira: a conquista do primeiro título como profissional, o de campeão baiano. O atacante, que fez oito gols no Estadual, foi às redes duas vezes no jogo decisivo, uma goleada por 5 a 1 no Itabuna, no Barradão.


- Foi muita emoção. Sempre lutei pelas conquistas coletivas, não as individuais, mas tenho amigos que brincavam que eu só ia para o time certo na hora errada. Quando eu saí do Santos, o clube começou a acreditar mais na molecada e foi campeão (em 2002). É aquela coisa, talvez se eu tivesse um empresário orientador desde o início, quem sabe não fosse mais vezes campeão. Mas a sensação da conquista (no Vitória) foi muito boa. É um clube com o qual me identifiquei muito – contou o centroavante, que quase foi campeão de novo em 2010, quando retornou ao Santo André, parando, por ironia, no Santos de Neymar, Paulo Henrique Ganso e Robinho.


Quase um 'louco do bando' e o retorno à Baixada


O detalhe é que, apesar de todo o vínculo com o Santos, Rodrigão quase parou no Corinthians. E mais: poderia ter feito parte do elenco campeão brasileiro em 2011. O centroavante se recuperava de uma contusão no tendão de Aquiles do tornozelo esquerdo com o médico Joaquim Grava, com quem havia operado. Na ocasião, o atacante Adriano começou a tratar a mesma contusão no Timão. Por recomendação de Grava, o ex-santista passou a trabalhar o CT alvinegro, junto do Imperador.



Lembro que, na ocasião, o Liedson estava com problema de joelho (esquerdo) e o Adriano ainda não tinha recuperado. Um auxiliar do Tite conversou comigo, o staff do clube, os fisioterapeutas... Eles estavam me preparando para fazer um contrato, de agosto ao final do ano. Por algum motivo, isso não se concretizou"


Rodrigão, sobre quase ter acertado com o Corinthians em 2011, ano que o Timão foi campeão brasileiro



- Acabei me recuperando mais rápido que o esperado. Eram seis meses de tratamento, mas fiquei bem em quatro meses e meio. E lembro que, na ocasião, o Liedson estava com problema de joelho (esquerdo), e o Adriano ainda não tinha recuperado. Um auxiliar do Tite conversou comigo, o staff do clube, os fisioterapeutas... Eles estavam me preparando para fazer um contrato, de agosto ao fim do ano. Por algum motivo, isso não se concretizou e segui na minha recuperação – recordou.


Rodrigou evitou comentar o porquê de ter se recuperado antes de Adriano.


- Olha, não posso falar dele. Posso falar da minha (recuperação). Eu queria retornar o mais rápido possível. Ia para o CT do Corinthians, e quando surgiu a possibilidade de assinar contrato, passei a tratar à tarde também.


Sem chance no Timão, Rodrigão voltou para casa, mais precisamente ao Jabaquara, de Santos, para disputar a quarta divisão paulista. Convidado pelo ex-goleiro Robson Agondi, foi apresentado como a principal contratação do Leão da Caneleira nos últimos anos, ao lado de Rubens Cardoso, campeão mundial pelo Internacional em 2006. Ele fez a parte dele: nove gols em dez jogos. O Jabuca, não: caiu na segunda fase do Estadual.


Rodrigão, centroavante do Aimoré, ainda pelo Jabaquara (Foto: Divulgação/Jabaquara)Rodrigão marcou gols pelo Jabaquara, pela Segundona, em 2012 (Foto: Divulgação/Jabaquara)


Em busca de uma nova oportunidade


No primeiro semestre de 2013, antes de retornar a Santos para defender a Portuguesa Santista, time pelo qual marcou seis gols em oito jogos na quarta divisão paulista, Rodrigão voltou ao Rio Grande do Sul, reforçando o Aimoré na Série A-2 do Gaúcho. Uma lesão no joelho direito em maio, porém, obrigou-o a deixar o time de São Leopoldo antes do previsto - não sem antes ser convidado para ser dirigente do Índio Capilé (como é conhecido o clube gaúcho). A oferta, no entanto, foi rejeitada, apesar de atender ao objetivo futuro do jogador. O centroavante ainda quer ficar mais tempo em campo.


- Você vê o Zé Roberto se dedicando, o Paulo Baier fazendo gols, outros jogadores acima de 35 anos atuando bem, como o Léo (do Santos)... A idade é relativa. Lógico que os jogadores que passam dos 32 anos precisam de um trabalho diferenciado, até porque o rendimento é melhor quando isso acontece. Percebi isso no Corinthians, porque via o (Emerson) Sheik fazendo isso, o Danilo, o Fábio Santos, o Paulo André... Jogadores que doavam 100% e foram campeões brasileiros, da Libertadores e do Mundial. Vai falar o quê?


Rodrigão no Aimoré, contra o Brasil de Pelotas (Foto: Divulgação / Aimoré)Rodrigão no Aimoré, contra o Brasil de Pelotas

(Foto: Divulgação / Aimoré)


O futuro de Rodrigão ainda é uma incógnita. De concreto, apenas um convite para retornar ao Aimoré, como jogador, para a disputa da primeira divisão do Gauchão – a equipe de São Leopoldo conquistou o acesso.


- Meu compromisso com a Portuguesa terminou junto com a participação do clube no Paulista. Neste momento, minha preocupação é recuperar o joelho direito. Tive que fazer duas infiltrações no período em que joguei pela Portuguesa e agora passo por avaliações e exames. Quero iniciar a próxima temporada sem nenhum problema médico.