sábado, 22 de junho de 2013

Lembra dele? Campeão por Peixe e Timão, João Paulo se diz privilegiado


Poucos jogadores passam com destaque por dois grandes rivais do futebol brasileiro como Santos e Corinthians. João Paulo de Lima Filho foi um desses raros privilegiados. Uma das referências da primeira geração de Meninos da Vila, campeã paulista de 1978, o ex-ponta esquerda também se destacou pelo Timão, campeão estadual dez anos depois.


Ídolo no planalto e na Baixada, o Papinha - como ficou conhecido durante a passagem pela Vila Belmiro - se aposentou há 20 anos, mas sempre esteve ligado ao futebol. Foi treinador nas categorias de base de Santos (1995), Força (2008 a 2010) e SC Barueri (2011 a 2012), trabalhou por quase sete anos com projetos relacionados ao esporte na Prefeitura de São Paulo e montou uma escolinha de futebol com o ex-jogador Edu.


Atualmente no comando do time sub-17 do São Bernardo, mas ainda morando em Santos, João Paulo ainda passa adiante a experiência adquirida em quase 20 anos de carreira e a vivência de um hoje "senhor" de 56 anos, celebrados no último dia 15.


João Paulo (Foto: Lincoln Chaves)João Paulo não esconde o orgulho por já ter defendido a dupla alvinegra (Foto: Lincoln Chaves)


- Acho que a trajetória está boa (risos). Acredito muito na transparência, pois é isso que faz o garoto ter confiança em você. O difícil não é treinar o atleta, mas administrar o grupo com 30 jogadores. É preciso ter jogo de cintura, mas quem já esteve lá dentro entende, sabe como falar. No futebol, a teoria ajuda muito, mas na base o cara (técnico) tem de ter conhecimento da prática - valoriza.


Um menino da Vila


João Paulo no Santos (Foto: Arquivo Pessoal)Destaque no São Cristovão, João Paulo chegou ao

Santos em 77 (Foto: Arquivo Pessoal)


Natural de São João do Meriti, região metropolitana do Rio de Janeiro, João Paulo iniciou a carreira no São Cristovão. Chegou à Baixada Santista em 1977, num momento difícil para o Santos, que não era campeão desde 1973 (última conquista da era Pelé). A torcida já se mostrava impaciente com a falta de resultados e os coros rivais de que, sem o Rei, o Alvinegro estava acabado.


- Era uma época meio turbulenta... O clube não ganhava títulos há um tempo e o time não despontava. Fomos disputar o Brasileiro, mas nós não começamos bem. Então, houve aquela reformulação - lembra, em alusão à oportunidade dada a Pita, Nilton Batata, Juary, Claudinho, Toninho Vieira e outras então jovens promessas, que receberam a incumbência de recolocar o Peixe na rota das vitórias. Cenário, aliás, não muito diferente do atual, no qual a safra de Neílton, Gabriel Barbosa e companhia ganha espaço na Vila Belmiro após a saída de Neymar.


Naquele Paulistão de 1978 – que, na verdade, terminou em junho de 1979 – a garotada do Santos aproveitou a chance que teve. Vice-campeão do primeiro turno, o Peixe chegou às semifinais do turno seguinte, caindo para a Ponte Preta. O desempenho nas duas etapas foi suficiente para levar o time ao terceiro e decisivo turno. Foi quando o Alvinegro engrenou de vez, conquistando o título em cima do São Paulo, após três jogos na decisão.



Nem a gente tinha noção do valor de tudo aquilo. É gratificante. Você fica marcado por anos, é algo que não se apaga"


João Paulo, sobre o título de 1978



- Já se passaram 34 anos desse título. Só que o avô conta para o filho, o filho para o neto, e por aí vai. As histórias se fazem assim. Nem a gente tinha noção do valor de tudo aquilo. É gratificante. Você fica marcado. É algo que não se apaga - destaca.


Por conta da longa duração do torneio, João Paulo se deparou três vezes com o Corinthians. As memórias, no entanto, não são das melhores. Em três jogos contra o Timão, três vitórias do rival – uma, inclusive, na final do primeiro turno da competição. A equipe do Parque São Jorge, aliás, foi uma verdadeira pedra no sapato durante o período que defendeu o Santos: foram 21 jogos contra o futuro clube, com nove derrotas e só uma vitória: 2 a 0, no Morumbi, pelo Paulistão de 1983 - o último dele na primeira passagem na Vila Belmiro.


- Não são recordações muito boas (risos). Ao longo dos anos, ganhamos poucas vezes. Mas foram grandes clássicos, levando 120 mil, 130 mil pessoas. Não dava menos gente que isso. Lembro que no 2 a 0, o Pita fez um dos gols. Foi marcante, pois estávamos há bastante tempo (oito anos) sem vencer o Corinthians - recorda.


Subindo a Serra


Antes adversário, o Corinthians se tornou o clube de João Paulo em 1984, após passagem relâmpago pelo Flamengo. Foram cinco anos no Parque São Jorge, com 258 jogos, 36 gols, duas finais de Paulistão e um título, em 1988. Coincidentemente, assim como o Santos de 1978, conquista do Timão veio com um elenco bastante jovem e renovado. A diferença é que se dez anos antes Papinha era só um menino de 21 anos, agora já era um veterano de 31, atuando ao lado das então promessas Ronaldo e Viola.


- Eu fiqui apreensivo no início (risos). Houve um amistoso contra o Taubaté no qual, além do resultado não ser satisfatório, o desempenho do time também não foi. Isso antes do Paulista. Mas depois, a equipe engrenou e chegou ao título - recorda, citando, ainda outros nomes do Timão campeão em 1988, como o ex-zagueiro (que à época atuava na lateral direita) Marcelo Dijan e o ex-volante Márcio Bittencourt (que já foi técnico do Alvinegro).


João Paulo no Corinthians (Foto: Arquivo Pessoal)João Paulo (em destaque), pelo Timão, no final da década de 80 (Foto: Arquivo Pessoal)


João Paulo admite que a ida para o Corinthians causou estranheza – e certa irritação – nos torcedores santistas, dada a identificação com o Peixe e a rivalidade do time praiano com o Timão. Ele, no entanto, minimiza o fato.


- Você sabe como o torcedor é apaixonado. Eles (santistas) não aceitavam muito isso, e eu até entendo. Mas faz parte. Tenho de ser profissional, defender as cores de onde trabalho. Graças a Deus, houve santistas, mesmo doentes pelo clube, que entenderam minha situação. Eu tive a felicidade de jogar lá (no Corinthians), e bem, por cinco anos. Isso que é importante – destaca o ex-ponta-esquerda, que costuma participar de jogos beneficentes defendendo veteranos tanto do Peixe, quanto do Timão.


O curioso é que em sua primeira decisão pelo Corinthians, João Paulo teve como rival exatamente o Santos, em 1984. Na final, disputada no Morumbi, o Peixe venceu por 1 a 0, gol de Serginho Chulapa, e ficou com o título. Papinha, porém, vai na contramão dos que dizem sentir “algo especial” quando encaram ex-clubes, apesar do que já construiu com a camisa santista. Frieza? Não. Profissionalismo, defende ele.



Acho que fui um privilegiado, porque fui ídolo de duas grandes torcidas"


João Paulo



- Sou profissional. Sempre fui. Nunca beijei escudo, nunca hostilizei torcida. Isso de sentir algo especial ao enfrentar ex-clube é balela. É querer fazer média – dispara.


O que não significa que ele minimize a história escrita tanto no Peixe como no Timão. Muito pelo contrário.


- Acho que fui um privilegiado, porque fui ídolo de duas grandes torcidas, disputei finais e fui campeão. São dois times enormes, que todos conhecem mundo afora, mesmo nos altos e baixos do futebol - conclui o ex-ponta, que ainda defenderia Palmeiras, Yamaha (Japão), São José, Grêmio Maringá e Náutico, antes de encerrar a careira em 1993.